Em audiência pública das quatro comissões que analisam a reforma do Código Florestal (PLC 30/2011), nesta terça-feira (13), o ex-ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e ex-ministro da Defesa, Nelson Jobim, avaliou que a principal dificuldade a ser sanada em relação aos aspectos jurídicos da proposta é administração de possíveis conflitos decorrentes de brechas ocasionadas pela competência legislativa concorrente, quando mais de um ente federado pode legislar sobre o mesmo assunto, obedecendo à primazia da União.
Isso porque o projeto prevê que estados e Distrito Federal aprovem leis sobre Áreas de Preservação Permanente (APPs), a fim de preencher lacunas deixadas pela norma geral. Segundo Jobim, se por exemplo os estados tiverem a prerrogativa de fixar o tamanho mínimo das APPs, podem ocorrer disputas interestaduais econômicas predatórias, causando danos ao meio ambiente.“A norma geral tem que assegurar que haja uniformidade, evitando a concorrência. O espaço dos estados tem que ser definido pela regra geral”, alertou.
Jobim advertiu, ainda, quanto à necessidade de os senadores aperfeiçoarem o texto do novo código, sem deixar margem a interpretações duvidosas. “Não exercitem formas de delegação de poderes de forma indireta, através de expressões ambíguas, porque quando o legislador usa da ambigüidade para conseguir formar a vontade majoritária, ele está transferindo um poder supletivo legislativo a quem não tem poder para tal, que é o Poder Judiciário, o que cria uma imensa confusão”, afirmou o ex-ministro.
Paulo Affonso Leme Machado, um dos maiores especialistas em direito ambiental do Brasil, lembrou que conforme o artigo 24 da Constituição Federal compete à União, Estados e Distrito Federal legislar concorrentemente em relação a florestas, porém o parágrafo terceiro explicita que somente se não houver lei federal sobre normas gerais os estados exercerão a competência legislativa plena, com o objetivo de atender a suas peculiaridades. “A competência legislativa suplementar visa fazer cumprir a norma geral, e não tomar outra direção”, concluiu.
Proteção das águas
O presidente da Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA), senador Rodrigo Rollemberg (PSB/DF), disse que os debates com os juristas trouxeram mais luz ao Código Florestal. Ele levantou a questão de a Constituição Federal, em seu artigo 22, definir que compete privativamente à União legislar sobre águas. Em sua opinião, como uma das mais importantes funções das APPs é a proteção das águas, todo cuidado deve ser tomado, no sentido de não permitir que uma unidade da federação venha causar danos aos recursos hídricos de outro Estado.
“Se por acaso um estado reduzir o tamanho de sua APP, isso pode prejudicar outro estado que faz parte da mesma bacia hidrográfica”, ponderou o senador, acrescentando que o Senado não fugirá à sua responsabilidade de analisar todos os aspectos do PLC 30, culminando com uma proposta moderna, que está sendo discutida amplamente por quatro comissões temáticas.
Mário José Gisi, subprocurador geral da República do Ministério Público Federal, um dos convidados da audiência pública, registrou que a fala de Rollemberg reforça a necessidade de prevalência das regras federais, especialmente no que se refere aos rios interestaduais.
A reunião conjunta da CMA com as Comissões de Agricultura e Reforma Agrária (CRA), Ciência e Tecnologia (CCT) e Constituição e Justiça (CCJ) contou, ainda, com participação de Antonio Herman Benjamin, ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ); e de Cristina Godoy de Araujo Freitas, promotora de Justiça do Ministério Público do Estado de São Paulo; além dos relatores do Código Florestal, senador Jorge Viana (PT/AC) e senador Luiz Henrique (PMDB/SC).